O desbravamento do território que viria a formar o município de Emas (1), prende-se ao ciclo da criação do gado e constitui-se num capítulo especial da história do Sertão do Piancó, cuja efetiva ocupação teve início ainda no final do século XVII, promovida por bandeirantes paulistas e baianos, vindos do São Francisco, que dividiram aquelas terras entre si. Naquela época, todo o sertão do Piancó era habitado por tribos indígenas, pertencentes à grande nação tarairiús, verdadeiros tapuias do Nordeste, que desde os primórdios da colonização se opuseram à penetração lusa e à conquista de suas terras.
Aqueles índios dividiam o sertão paraibano com os cariris, com os quais, muitas vezes foram confundidos. Nação formada por muitas tribos, os tapuias praticavam o endocanibalismo, ou seja, comiam seus próprios parentes, alegando “que não havia lugar melhor para guardar os seus do que dentro de si mesmo” (2).
Possuidores de uma grande altura, força e coragem, corriam como um cavalo, alimentando-se basicamente de mel de abelha, “que habilmente tiravam das árvores e misturavam com o pó moído dos ossos de seus mortos, para beber”(3).
Habitavam o Sertão do Piancó as tribos Coremas, Panatis e Icó, e, especialmente no local onde se ergue hoje a cidade de Emas, os Coremas.
No entanto, a presença do elemento branco desbravador provocou forte reação entre indígenas da região, que se uniram e resistiram à penetração luso-brasileira, dando início à chamada 'Guerra dos Bárbaros'. E, para combater os índios rebelados nas guerras da conquista do sertão, as autoridades régias não só requisitaram os serviços dos paulistas, como também, chegou-se a institucionalizar alguns terços paulistas, como foi o caso do liderado por Manoel Álvares de Moraes Navarro, na capitania do Rio Grande.
À época, os paulistas eram vistos como homens capazes de suportar as asperezas do sertão, bem como fazer frente, pela experiência que tinham adquirido, aos 'índios bravos' da região. Vale destacar, que os terços paulistas eram formados em sua maioria por índios recrutados junto às vilas do litoral ou mesmo no sertão.
Com a submissão total dos silvícolas, ocorrida nas primeiras décadas do século XVIII, surgiram muitas fazendas de gado na região, núcleos iniciais das várias cidades, que integraram o vastíssimo município de Piancó, até o início da segunda metade do século passado. Tais núcleo de ocupação humana derivaram da “conjugação do elemento religioso, representado pela edificação de uma capela, como o elemento econômico, apoiado na criação do gado” (4).
Assim, inicialmente surgia a fazenda e nela, com o tempo, era construída uma pequena capela, em redor da qual, surgiam algumas casas, dando, assim, início a um pequeno arraial.
A princípio, quase todas as terras localizadas na Ribeira do Piancó foram concedidas a Francisco D'Ávila Lins, senhor e proprietário da famosa Casa da Torre, na Bahia. Tais terras, no sertão paraibano, eram administradas por procuradores, entre os quais figuraram os irmãos Oliveira Ledo.
Estas terras foram concedidas à Casa da Torre, na própria Bahia, pelo Vice-rei do Brasil, causando alguns embaraços ao governo da capitania da Paraíba, de forma que poucas foram as concessões de sesmarias feitas no Sertão de Piancó até a primeira metade do século XVIII, pelo governo local. E, muitas destas, diziam respeito à legalização da posse das terras, adquiridas por compra aos herdeiros da mencionada Casa da Torre.
Um exemplo disto é a Fazenda Várzea do Ovo que foi adquirida por Luís Mendes de Sá (6), em 1740. Segundo um documento da época, a referida fazenda, localizava-se às margens do Rio dos Porcos, seguindo pelo "rio acima e abaixo (Rio Piancó), que a divide... parte do nascente com a Serra Branca, de poente com o Sítio do Genipapo, do norte com a Serra do Campo Grande e do sul com as serras do Cortume" (7).
Aos 27 de outubro de 1748, um certo Bento Alves de Figueiredo, alegando ser "morador no sertão chamado Riacho dos Porcos, districto de Piancó desta capitania, diz que possue a dezoito annos um sitio de terras de crear gados e lavouras no mesmo riacho onde chamão S. Francisco, nas quaes terras tem feito outra povoação chamada Olho D'agua em que habita com a sua familia, tende as arrematado em praça em exeução que se fazia a Felippe Delgado, nem este e nem outra pessoa alguma lhe entregou data das dias terras nem consta que o haja de todas, nem de parte das ditas terras" solicitou a concessão das ditas terras, medindo "tres leguas de comprido e uma de largo, fazendo peão no pé do serrote de S. Francisco legua e meia para leste e legua e meia para oeste, rio acima, com meia legua para cada banda do dito serrote para baixo do dito serrote para cima, com toda largura de uma legua para a parte do sul que vae entestar com o sitio do Cravatá que já tem povoação do supplicante chamada Estivas" (8).
O território do atual município de Emas é constituído por partes das datas (sesmarias) da Várzea do Ovo e Campo Grande. Pelo demonstrado, Bento Alves de Figueiredo já se encontrava no território do futuro município de Emas desde 1730. Possivelmente, tenha sido um dos vários vaqueiros vindos da Bahia, contratados pelos herdeiros da Casa da Torre (9).
Outra particularidade mostrada por essa sesmaria é que a antiga Fazenda Várzea do Ovo pertenceu inicialmente a um certo Felipe Delgado. Em 1752, o alferes Felix Barbosa e dona Maria dos Prazeres Ponce de Leon, solicitou a concessão de umas terras no sertão do Piancó, que se limitavam com a data dos Oliveira Ledo, pelo norte e com a Serra Branca e com a Várzea do Ovo, pelo leste (9).
Serra do Campo Grande
Aos 20 de março de 1757, dona Severina Vieira, viúva do capitão Luís Mendes de Sá, em petição endereçada ao governo da Capitania da Paraíba, alegou "que tinha seos gados e lavouras no sítio de Varzea do Ovo, daquelle logar, o qual sitio possuía a supplicante por si e seu defunto marido que o comprará à casa da Torre, e porque lhe poderão mover duvidas por não ter a supplicante data de sesmaria, para evita-la pretende tirar a data do dito sitio da mesma sorte tinha possuído e possuía, desde a extrema do sitio Vezinho pelo logar onde estava a Caza da Fazenda para o nascente a partir na passagem de Bento de Souza e com a Fazenda Serra no meio do Poço Chamado da Serra, para o poente entre as Varzea das Emas e dos Angicos aonde tinha um parco que partia com a Fazenda Genipapo para o norte nas serras do Riachão, para o sul na Serra da Borburema concedendo-se à supplicante tres léguas de comprido e uma de largo, fazendo da largura comprimento ou do comprimento largura, e pedia se lhe concedesse por sesmaria as ditas terras na forma confrontada conforme era costume"(10).
Em 28 de abril daquele mesmo ano, dona Joana Maia Martins, viúva do ajudante Pedro Velho Barreto, solicitou a concessão de umas terras que se limitavam com a Fazenda Várzea do Ovo, nas proximidades do Serrote do Campo Comprido do Saco, "onde extrema com a Serra Branca e fronteiro ao mesmo Serrote com o Olho D'Água do Macaco e da parte do sul a contesta com a Serra da Borburema"(11).
Outra parte do futuro território de Emas, que também pertencia à Casa da Torre, dos D'Ávilia Lins, foi adquirida por compra feita pelo coronel João Leite Ferreira, de cuja Casa era também procurador, no Piancó e em outras ribeiras.
Em 10 de março de 1759, aquele senhor objetivando legalizar a posse de sua propriedade, requereu sua sesmaria, alegando ser morador do sertão do Piancó e possuidor de "um sítio de terras de crear gados no mesmo sertão do Piancó, chamado Campo Grande", adquirido por compra feita à Casa da Torre, através de "uma simples escriptura, sem mais outro título junto". Declarou ainda que a sesmaria pretendida media três léguas de comprimento por uma largura, "correndo o rumo direito para a parte do nascente, a entestar com a Serra Branca e a Varzea do Ovo, e pela parte do poente a entestar com o Sítio da Barra e S. Paulo, e pela parte do norte a entestar com a Serra do Olho D'Água e para o sul com o Sitio do Genipapo [...]"(12).
Baiano, o coronel João Leite Ferreira chegou ao sertão do Piancó em idos de 1755, passando a dedicar-se à lavoura e à criação de gado, administrando propriedades dos D'Ávila Lins. Casado com dona Antônia Tereza de Melo, "sua descendência imediata constava de vários filhos, cujos ramos se espalharam pelos municípios seguintes: Piancó, Conceição, Pombal e Teixeira, formando numerosos ramos genealógicos, perpetuando o nome e a lembrança das velhas raças povoadoras dos sertões nordestinos"(13).
Da mesma forma que o coronel João Leite Ferreira, alegando ter comprado à Casa da Torre e não ter título de propriedade de suas terras, João de Melo Leite solicitou a concessão das terras nas quais encontrava-se empossado, localizadas na parte do sul do pé da Serra do Campo Grande. A referida concessão foi feita em 14 de abril de 1759, pelo governador José Henrique de Carvalho (14).
Casa Grande da Fazenda Campo
Outra concessão no território que mais tarde formaria o município de Emas foi feita no dia 3 de março de 1757, a um certo José Pereira da Cruz, "morador no Sertão do Piancó", que alegou ao governo da Capitania da Paraíba que era "senhor e possuidor de um sítio de terras no dito sertão, chamado Ginipapo que tinha povoado com casas, vivendas, gado vaccum e cavallar, e que o houvera por compra, que delle tenha sido feito a mestre-de-campo, Francisco D'Avila, e como não tinha mais titulo do que a escritura de venda que se lhe havia feito, e para segurança de sua posse e domínio queria alcançar delle data de sesmarias, confrontando pela parte do nascente com o sitio - da Vargem-do-Ovo- pela vargem do Angicos e Várzea da Emas e pela parte do poente com o sítio do Peixoto e da S. Cruz, e pela parte do sul com o sitio Malhado do Boi na Lagôa do passarinho e pela parte do norte com o sitio Campo Grande pela parte da serra do mesmo sitio, servindo esta e a das Queimadas de divisão com três léguas de comprido e uma de largo"(15).
A referida sesmaria faz referência a grande parte do território emense, enumerando importantes localidades, que até o presente ainda preservam seus topônomios, a exemplo de Campo Grande, Angicos, Várzea do Ovo, Várzea da Ema e Jenipapo.
A origem da povoação, núcleo inicial da atual cidade de Emas, necessita de maiores esclarecimentos.
Em 1976, publicou-se a 'Enciclopédia dos Municípios Paraibanos', onde lê-se que "Joaquim Nunes de Gouveia, em 1917, lançou as sementes que mais tarde germinariam e formaria o povoado que seria transformado no progressista municípios de Emas (1)".
Esta informação vem sendo repetida nos últimos trinta e cinco anos, em todos os trabalhos produzidos e divulgados sobre Emas, sem um sustentáculo bibliográfico digno de confiança. No entanto, trata-se de uma afirmação que necessita ser reavaliada.
A história provinciana revela que o núcleo inicial da atual cidade de Emas foi a 'Povoação de Várzea da Ema', parte integrante do antigo território do município de Piancó, sede da histórica Freguesia de Santo Antônio. As origens dessa povoação remontam ao século XIX e não ao ano de 1917.
É importante ressaltar que já no século XIX existiam na região as condições propícias à criação de uma povoação. Na época, era comum instalar os núcleos de ocupação humana, próximos aos cursos d'água e assim ocorreu com a povoação Várzea da Ema: foi instalada às margens do Rio dos Porcos, servindo como ponto médio entre as Fazendas Campo Grande e Angicos, que se destacavam como importantes núcleos agropecuários em todo o sertão do Piancó.
Dicionário de Milliet, 1845
No 'Diccionario Geographico, Historico e Descriptivo do Imperio do Brazil', publicado por J. G. R. Milliet de Saint-Adolphe, em 1845, encontramos a primeira referência à Povoação de Várzea da Emas, quando lê-se: “Piancó: Villa da provincia de Parahiba, 100 legoas pouco mais ou menos a poente da cidade capital da província, e 12 ao sudoeste da Villa de Pombal, na comarca d’este nome. Foi largo tempo uma freguezia consideravel, cuja matriz tinha por padroeiro Santo Antonio. Seu termo, um dos mais férteis e ricos da província, pertencia ao districto de Pombal, e tinha em 1815 perto de 8.000 habitantes. No cabo de longas e reiteradas instancias dos moradores, por um decreto de 11 de novembro de 1831, foi esta freguezia condecorada com o título de Villa Constitucional de Santo Antônio de Piancó, assignalando-lhe o mesmo decreto por districto o próprio termo de sua freguezia, o qual encerra as povoações de Boa Vista, Boqueirao, Brejo da Cruz, Caiporas, Caissara, Canoa, Catolé, Catolé de Baixo, extremo, Formiga, Furado, Genipapo, Jabotá, Paó Ferrado, Pilar, Rancho do Povo, São Boaventura, São Lourenço, Umari e Varzea-da-Ema" (2).
Com base no exposto, constata-se que as origens da Povoação de Várzea da Ema remontam à primeira metade do século XIX. No entanto, é necessário esclarecer que as antigas povoações eram estruturadas de acordo com as limitações da época: casas rústicas e taipa, uma pequena venda, capela simples com chão batido. À medida que essa povoação ia ganhando importância, tudo em sua volta ia mudando, surgindo os primeiros indícios de urbanização.
Dificilmente as antigas povoações conseguiam manter sua importância econômica. Possivelmente, tenha ocorrido o mesmo com a de Várzea da Ema [ou de Emas, conforme a maioria dos documentos públicos]. Adquirindo o status de povoado, por algum fator, a pequena povoação às margens do Rio dos Porcos entrou em decadência, possivelmente, com o surgimento da povoação de Catingueira, em local de melhor acesso. Cortada por uma estrada que ligava as vilas de Patos e Piancó, a fazenda de Catingueira passou a adquirir importância e tornou-se uma coordenada geográfica na região, na segunda metade do século XIX, exatamente quando a Povoação de Várzea da Ema começava a declinar (3).
Outros registros históricos sobre a mencionada povoação, localizada às margens do Rio dos Porcos e distante cerca de meia légua da sede da histórica Fazenda do Campo Grande, aparecem em Relatórios e Falas dos Presidentes da Província da Paraíba, datadas 1868 e 1870. Distante da principal estrada que cortava o sertão do Piancó, a Povoação de Várzea da Ema permaneceu esquecida até a primeira década do século XX, quando novamente passou a ter uma significância econômica. Antes, ocorreram vários fatos em sua história dignos de registros.
Em 1860, passou pelo território do futuro município de Emas, o Dr. Luís Antônio da Silva Nunes, presidente da Província, que objetivando conhecer in loco as necessidades do interior, realizou uma excursão pela Paraíba, saindo da capital em 17 de setembro daquele ano, percorrendo os termos de Pilar, Ingá, Campina Grande, Cabaceiras, São João do Cariri, Teixeira, Piancó, Souza, Catolé do Rocha, Pombal, Patos, Pocinhos, Alagoa Nova, Areia, Bananeiras, Independência (hoje Guarabira), Mamanguape, Alhandra e Pedras de Fogos.
O referido presidente retornou à capital paraibana, após trinta e dois dias, tendo percorrido a cavalo mais de 292 léguas. Da Fazenda Catingueira, núcleo da atual vizinha cidade de mesmo nome, saiu Sua Excelência com destino à Fazenda Angicos, no atual município de Emas, onde chegou na manhã do dia 28 de setembro de 1860, uma sexta-feira. Na época, o jornal 'O IMPARCIAL', que circulava na capital paraibana, assim noticiou o fato:
"No dia seguinte, 28, às 6 horas e meia da manha, continuou s. Exa. a viagem, tendo de tomar pouso na Fazenda Angico, propriedade do Sr. José Lopes da Silva, subdelegado de Piancó, onde apeou-se S. Exa. às 8 horas e quarenta minutos, depois de percorrida a distância de quatro léguas.
A fazenda Várzea do Ovo dista de Angico duas léguas, aquém desta, tem sua lenda muito interessante, que prova o quanto conseguem a constância de mãos dadas com a economia: "Esse nome (Várzea do Ovo) provém de ter uma madrinha dado a um afilhado um ovo, que, a pedido desta, foi deitado em uma galinha, daí saiu um pinto, que cresceu e tornou-se uma galinha, que produziu muitos ovos, estes pintos, vendeu-se os ovos e galinha deu dinheiro para se comprar uma novilha, que produziu também. E afinal o dinheiro de ovos, galinhas, novilhas e mais descendentes deu dinheiro para se comprar uma fazenda, que veio a ter essa denominação; dando um ovo para tudo isso"(4).
Homem de reconhecida cultura, o Dr. Silva Nunes em 15 de junho de 1860, apresentou à Assembléia Legislativa Provincial, um substancial Relatório, abordando as condições em que encontrou a Província, que ainda hoje, serve como fonte de pesquisa para a história administrativa da Paraíba. Assim, o Dr. Silva Nunes entrou para a história de Emas como sendo o primeiro governante da Paraíba há pisar em seu solo.
Natural do Rio Grande do Sul, Silva Nunes diplomou-se em ciências jurídicas pela Faculdade de Direito do Recife, em 1854. Por Carta Imperial datada de 20 de março de 1960, foi nomeado presidente da Província da Paraíba, empossando-se no referido cargo aos 17 dias do mês seguinte. Durante sua administração criou a freguesia de Misericórdia (hoje Itaporanga) e a vila de Pedra de Fogo, aos 11 de julho e a 6 de agosto de 1860, respectivamente (5).
Casado com a senhora Joana Silva Nunes, filha do Marquês de Muritiba, deixou o governo da Paraíba em 17 de março de 1861, após ter sido eleito deputado geral, pela Província do Espírito Santo. Administrador probo, "tudo quanto se refere a objeto de serviço público foi rigorosamente examinado pelo digno presidente: a instrução pública, a magistratura, as cadeias, as matrizes, as obras públicas, a guarda nacional, as municipalidades, a polícia, etc." (6). Antes de Silva Nunes, "nenhum presidente tinha ainda visitado a Província da Paraíba em toda a sua extensão" (7). E quando deixou a referida Província na tarde do dia 26 de março de 1861, "ao embarcar o Sr. Silva Nunes, em companhia de sua esposa d. Joana da Silva Nunes e de sua irmã, d. Maria Tereza, fez questão de abraçar, um a um, a todos os senhores que se dignaram em acompanhá-lo, e mostrou comovido ao separar-se dessa porção de amigos e correligionários que o honraram durante o tempo em que administrou esta Província" (8).
Relatório do Dr. Silva Nunes - 1860
Primo e amigo íntimo do grande poeta Álvares de Azevedo, de quem era confidente, o Dr. Silva Nunes representou a Província do Espírito Santo na Assembléia Geral de 1861 a 1865. Posteriormente, governou a Bahia de 16 de agosto de 1875 a 5 de fevereiro de 1877. Anos depois da morte prematura do grande poeta, organizou parte de sua produção literária no livro 'O conde Lopo' e publicou-o em 1886, através da Tipografia Leuzinger, no Rio de Janeiro (9). Nascido em 1831, o Dr. Silva Nunes faleceu em 1911, aos oitenta anos de idade incompletos.
Quanto ao anfitrião José Lopes da Silva, senhor e proprietário da Fazenda Angicos, era filho do sargento-mor Manoel Martins Lopes, a quem cabe a fundação da referida fazenda, cuja Casa Grande foi construída em 1792 e ainda hoje ostenta a influência que seus antigos proprietários possuíam.
Fazendeiro influente, filiado às hostes do Partido Conservador, Zé Lopes ocupou com distinção o cargo de subdelegado do município de Piancó. Membro da antiga Guarda Nacional, foi distinguido com a patente de Tenente Coronel, tornando-se Comandante do 20º Batalhão estacionado na Vila do Piancó. Por ato datado de 28 de setembro de 1868, foi suspenso de suas funções. No entanto, em 21 de outubro de 1878, o presidente da província reintegrou-o ao referido posto.
Casa Grande da Fazenda Angicos, construída em 1792,
onde em 1860, seu proprietário recebeu a visita
do Dr. Silva Nunes, presidente da Província
Major Wenceslau Lopes,
o primeiro filho de Emas eleito deputado estadual
Em primeiras núpcias, casou-se com Francisca Leite da Silva, de cuja união, nasceram entre outros, os seguintes filhos:
1. Wenceslau Lopes da Silva (major da Guarda Nacional), fazendeiro e político influente, ligado politicamente ao presidente e senador Álvaro Machado, elegeu-se deputado estadual por três legislaturas, ainda no início do período republicando, tendo permanecido na Assembléia Legislativa de 1896 a 1907. Deixou ilustre descendência. Foi primeiro filho de Emas a ocupar uma cadeira no Legislativo Estadual, após a proclamação da República.
2. Antônio Lopes da Silva (Major Totó), nascido em 1880, senhor e proprietário da Fazenda Saudade, no atual município de Emas. Fiscal do Consumo Federal, casou-se com Zulmira Ernestina Leite de Araújo, filha do Dr. José Peregrino de Araújo, desembargador e ex-governador da Paraíba. O referido casal deixou grande e importante descendência (10).
Em 1879 nascia no território do futuro município de Emas - àquela época, parte integrante do município de Piancó - Francisco Lopes de Souza, filho do José Lopes de Souza e Ana Lopes da Silva Loureiro (Mãe Naná). Vocacionado para sacerdócio, foi o primeiro filho da futura cidade de Emas há ordenar-se padre.
Exerceu seu ministério em Piancó e em Cajazeiras. Nessa última cidade, durante o ano de 1924, ocupou o cargo de diretor do Colégio Padre Rolim, onde exerceu com destaque e eficiência, a função que lhe foi confiada (11). Em 1936, foi nomeado vigário da histórica Matriz de Santo Antônio, de Piancó, ali permanecendo por pouco tempo. Intrépido, o padre Lopes faleceu no dia 7 de fevereiro de 1951 (12), deixando uma longa lista de serviços ao povo católico do sertão do Piancó.
Outro filho ilustre da futura cidade de Emas foi o Dr. Manoel Leite de César Loureiro, nascido na Fazenda Angicos, em 1844. Diplomado pela Faculdade de Direito do Recife (1865), fixou residência em Piancó, onde exerceu a advocacia e militou na política, elegendo-se presidente da Comissão do Partido Conservador, naquele município, em 1870. Eleito deputado provincial, ocupou uma cadeira na Assembléia Legislativa, durante as legislaturas de 1872-1873 e de 1874-1875.
Era ainda deputado quando foi nomeado para ocupar o juizado municipal de Catolé do Rocha, no alto sertão paraibano. Casado com dona Francisca Rodrigues de França Leite, deixou ilustre descendência. O Dr. Manoel Leite foi o primeiro filho da futura cidade de Emas a conquistar um diplomar superior, foi seu primeiro advogado e o primeiro emense a ocupar na Assembléia uma cadeira de deputado.
Seu filho, Nicolau Leite de César Loureiro, nascido na Fazenda Angicos em outubro de 1869, embora não tenha cursado direito, possuía amplos conhecimentos na ciência de Ulpiano, tendo ocupado o cargo de adjunto do Promotor Pública da Comarca de Piancó, em 1896. Ali também foi primeiro suplente de delegado de polícia (1903), e, ingressando na política, elegeu-se vereador em 1935. Escolhido por seus pares para ocupar a presidência da Câmara Municipal, nessa condição, assumiu interinamente os destinos políticos do referido município, em 1937. Ocupava ainda a presidência do legislativo piancoense quando veio a falecer em 2 de janeiro de 1941. Foi casado em primeiras núpcias com Ana Lopes e, em segunda, com dona Maria do Desterro. Entre seus filhos, destacaram-se Basiliano Lopes Loureiro, que foi prefeito nomeado de Piancó (1935) e Severino Lopes Loureiro, o professor Loureiro, que exerceu seu magistério em Campina Grande, onde adquiriu e manteve até sua morte, o Colégio Alfredo Dantas.
Nicolau Leite César Loureiro e família
Durante o século XIX, o território que mais tarde constituiria o município de Emas era formado por várias fazendas, entre as quais se destacavam: Riacho dos Bois, propriedade do Coronel João Leite Ferreira (2º do nome); Campo Grande, propriedade do major José Alves da Silva; Poço Escuro, propriedade de Francisco de Paula e Silva; Angicos, propriedade de Nicolau Leite César Loureiro e Jenipapo, propriedade de Inocêncio Leite Ferreira (13), onde cultivava-se o algodão mocó em grande quantidade e mantinha-se extensa criação de gado.
É importante registrar que o Cel. João Leite Ferreira, em Piancó, foi administrador da Freguesia (1823), comandante da Guarda Nacional (1831) e membro do Esquadrão de Cavalaria (1841) Filiado às hostes do Partido Liberal, sem sombra de dúvidas, foi a maior estrela política do sertão do Piancó, durante a primeira metade do século XIX, tendo, inclusive, comandado forças contra Pinto Madeira (1832) e elegido-se deputado provincial (1840).
Registra a tradição local, que no início do século XX, Joaquim Nunes de Gouveia, antigo morador da povoação de Emas, desenvolveu os esforços necessários para a realização da primeira feira na localidade, tendo sido também significativa a sua contribuição ao desenvolvimento urbano da futura cidade. O mesmo era filho de João Nunes Tavares, que chegou ao atual município de Emas em 1906, já viúvo, procedente da antiga povoação, hoje, cidade de Imaculada-PB. Aqui, comprou ao senhor José da Silva Cavalcanti, parte do sítio Várzea de Emas, onde construiu uma casa e passou a residir com sua família.
Aspectos da cidade de Emas no passado
A presença de Joaquim Nunes de Gouveia somente é registrada na região a partir de 1917. Viúvo, casou-se com dona Maria Pordeus Dantas, procedente de Pombal. E, na Várzea de Emas construiu uma casa e instalou uma pequena mercearia. É oportuno registrar que antes do mesmo chegar à região, a povoação de Várzea de Emas já existia, embora encontrasse decadente. Para sua fundação fortemente contribuíram os senhores José Lopes da Silva e o coronel João Leite Ferreira (2º do nome).
Ao senhor Joaquim Nunes de Gouveia cabe o reconhecimento pelos esforços desenvolvidos no sentido de fazer com que a povoação da Várzea de Emas progredisse. E assim o fez quando instalou sua mercearia, que em pouco tempo passou a abastecer a população da região com gêneros alimentícios vindos do Brejo de Areia.
Ao referido patriarca também deve-se a instalação da primeira bolandeira a vapor na localidade, passando a beneficiar grande parte do algodão que era produzido na região e que funcionava num antigo prédio, que anos mais tarde foi demolido para dar lugar a atual Escola Estadual de Ensino Fundamental Padre José Lopes.
Aspectos da cidade de Emas no passado
Assim, no início do século XX, Emas era um simples agregado de casas sem importância econômica, que integrava o extenso município de Piancó, na condição de termo do distrito de Catingueira, criado no final do século anterior.
Em idos de 1923, a Firma Araújo Rique & Cia, em parceria com o senhor Manuel Pereira Filho, instalou na Fazenda Várzea Nova, uma grande máquina a vapor para o beneficiamento do algodão produzido na região. Em pouco tempo, esse empreendimento determinou o fechamento da pequena usina fundada por Joaquim Nunes, em Emas.
Antônia Loureiro
A atual capela de Santa Terezinha do Menino Jesus teve sua construção iniciada em 1934, sob um terreno doado por dona Maria Joaquina da Conceição (viúva de João Nunes Tavares). Na oportunidade, figuraram como construtores Severino Leite Ferreira e Manoel Antas Pegado. Para a construção da referida capela, fortemente contribuíram o senhor Manoel Nunes Tavares e dona Antônia Loureiro. No dia primeiro de outubro daquele mesmo ano, celebrou-se no novo templo a primeira missa, pelo padre Abdon Pereira, vigário de Piancó.
Ruínas da Antiga Usina Araújo Rique & Cia
Em 1936, segundo relato de 'A União', existia na localidade uma usina de descaroçar algodão e uma tecelagem manual. O transporte de mercadoria e de pessoas era feito por três caminhões pertencentes a proprietários locais. Praticamente não existia vida social no povoado. Existiam dois cafés e um jogo de bilhar, localizados no início da atual Rua José Celino, onde os moços da localidade se divertiam. Ainda hoje é possível observar os antigos casarios de Emas, nesse trecho da cidade, apesar das fachadas de várias residências já terem sido alteradas.
É importante ressaltar que o efetivo desenvolvimento da Povoação Emas registrado na primeira metade do século XX somente se desencadeou após a instalação da Usina de Araújo Rique, que passou a comprar todo o algodão produzido na região, empregando uma significativa quantidade de pessoas, e, indiretamente, beneficiando um número ainda maior, vendendo a fibra descaroçada para Patos e Pombal. Dessa empresa, posteriormente, o senhor Nestor Pereira de Morais, que foi vice-prefeito e nessa condição administrou o município de Emas interinamente, tornou-se um de seus sócios.
NOTAS
1. AMORIM, Luís Otávio (Coord.). Enciclopédia dos municípios paraibanos. João Pessoa: Correia da Paraíba, 1976, pág. 186.
2. SAINT-ADOLPHE, J. G. R. Milliet de. Diccionario Geographico, Historico e Descriptivo do Imperio do Brazil. Tomo Segundo. Pariz: J. P. Aillaud Editor, 1845, pág. 297.
3. Um dos principais incentivadores do desenvolvimento da povoação de Catingueira, foi o coronel Firmino Aires Albano da Costa (filho do patriarca Pedro Firmino da Costa), que elegeu-se deputado provincial e ocupou uma cadeira na Assembléia Legislativa, nas legislaturas de 1886-1887 e de 1888-1889. Nesse período, por força da Lei Provincial nº 386, de 9 de setembro de 1887, a povoação de Catingueira tornou-se sede de um distrito de paz e como termo judiciário da Comarca de Piancó, manteve a denominação de povoação de São Sebastião da Catingueira, até 23 de julho de 1890, quando passou a denominar-se de povoado do Jucá (Decreto nº 27).
4. SEIXAS, Wilson. Op. cit., pág. 80.
5. PINTO, Irineu Ferreira. Datas e notas para a história da Parahyba (II).João Pessoa: EDUFPB, 1978, pág. 284-285.
6. SEIXAS, Wilson. Op. cit., pág. 17.
7. Idem, pág. 17-18.
8. SEIXAS, Wilson. Op. cit., pág. 58-59.
9. SILVA, Luciana Fátima da. Álvares de Azevedo: o poeta que não conheceu o amor foi noivo da morte. São Paulo: Annablume, 2009, p. 26.
10. CAVALCANTI, Francisco Pereira; CAVALCANTI, Franciraldo Loureiro. Memorial das famílias Pereira Cavalcanti e Lopes Loureiro. João Pessoa: UNIPÊ, 2006, pág. 231 e 314.
11. MARIZ, Celso. Cidade e homens. 2 ed. João Pessoa: A União, 1985, pág. 96.
12. CAVALCANTI, Francisco Pereira; CAVALCANTI, Franciraldo Loureiro. Op. cit., pág. 306.
13. BRASILINO FILHO, Clodoaldo. Piancó: 250 anos de história. João Pessoa: Imprell, 2003, pág. 17.